-
Compreendendo as doenças pulmonares segundo a Medicina Tradicional Chinesa
Estamos no outono e vivendo um período seco e poluído, especialmente aqui em São Paulo. Nesta época são frequentes as ocorrências de gripes e resfriados que quando mal curados, podem levar a quadros mais graves como os de bronquite, asma e até pneumonia.
O Pulmão é especialmente prejudicado, pois depende da boa qualidade e da umidade do ar para executar plenamente a atividade respiratória.
Segundo a medicina tradicional chinesa além de controlar a respiração, o Pulmão é responsável por controlar a abertura e o fechamento dos poros, a fim defender o organismo das mudanças climáticas ou temperaturas intensas, por aquecer a superfície corporal e também direcionar os fluidos corporais para a pele e para a Bexiga, a fim de promover a micção.
Devido ao declínio da produção que faz de energia este órgão se torna mais vulnerável, o que facilita a invasão de fatores patogênicos no interior do mesmo e a inibição do direcionamento dos fluidos corporais, propiciando o acúmulo de muco no interior do Pulmão. Este quadro leva a um processo inflamatório e infeccioso das vias aéreas, caracterizado pela diminução dos grandes e pequenos caminhos de passagem do ar e pelo espasmo dos músculos lisos dos brônquios.
Fatores genéticos podem indicar uma propensão ao desenvolvimento da bronquite e da asma, e podem ser constatados a partir da presença de chiados, respiração ofegante e manifestação de quadros alérgicos no histórico familiar e no histórico pessoal durante a infância.
Imaturidade, envelhecimento e estresse psíquico, como por exemplo, a tensão emocional, a frustração, o ressentimento também podem contribuir para o desenvolvimento das doenças pulmonares, pois paralisam a circulação livre de energia do organismo e dessa forma, inibem o direcionamento de energia realizado pelo Pulmão.
A medicina tradicional chinesa atribui a formação de muco e mucosidade-calor (muco espesso, amarelo e febre) não só a obstrução da função do Pulmão devido ao ataque dos fatores patogênicos externos, mas também a uma deficiência da função do Baço, de transformar e transportar os fluidos corporais pelo corpo, o que leva a formação de muco e a obstrução de circulação de energia para o Pulmão.
Outras desordens na energia também são causadores da doença: a inabilidade do Rim em segurar a energia do ar direcionada pelo Pulmão, que leva ao sintomas da asma e a estagnação da energia do Fígado em circular energia para o Pulmão, impedindo suas funções.
Portanto ao se procurar um tratamento pela medicina chinesa deve-se ter em mente a possibilidade de desequilíbrio em todos esses órgãos e nos quadros agudos, onde há ocorrência de dispneia, respiração superficial, cianose, letargia, o tratamento é emergencial e o paciente deve ser encaminhado para o hospital.
As chances de se prevenir e minimizar a manifestação da doença no período do outono e inverno aumentam quando o indivíduo é tratado durante a primavera e o verão.O tratamento é longo e inclui acupuntura, moxabustão e fitoterapia, podendo apresentar muito bons resultados.
-
Artigo na Revista Medicina Chinesa Brasil #12
Na edição número 12 da Revista Medicina Chinesa Brasil, tivemos o artigo “Medicina Chinesa em campo: o Meio Campo” publicado. Ele faz parte de uma série de artigos que visam explicar os complexos conceitos das funções dos Órgãos e Vísceras (Zang Fu) para o leigo de maneira mais palpável, utilizando da analogia com o futebol.
A revista é uma grande referência na área da Medicina Chinesa contanto sempre com artigos sobre a situação da prática desta medicina em nosso país, no mundo, sobre pesquisas modernas e sobre tratados clássicos.
As ilustrações desta série de artigos são do excelente Caio Vitor. Para mais informações visite: http://cargocollective.com/caiovitor
A revista é digital, grátis e pode ser acessada pelo link: http://www.ebramec.com.br/revistamcb_12.htm
Edgar Cantelli Gaspar – edgar@terapiaschinesas.com.br – Twitter: @edgarcantelli
-
Medicina Chinesa em campo – o meio campo
Um time pode até ganhar jogando feio. Alguns dizem que o que importa é somente o gol, que pode até ser de mão. Mas quem gosta mesmo de futebol, além de ver o time ganhar, gosta de ver um futebol bonito. Quantos torcedores não param para ver o Barcelona jogar. Ou até mesmo o Santos, para não ir tão longe. E todo esquadrão que encanta os olhos, dando vontade de vê-lo em campo, mesmo que não seja seu time, tem, certamente, um grande meio de campo.
É um time que sabe passar a bola com facilidade, ligando a defesa ao ataque com eficácia. Mas também é um time que sabe marcar, não deixando a zaga desprotegida. E esse é o papel do nosso Pulmão (肺 – Fèi), segundo a visão da medicina chinesa.
O Pulmão é um dos nossos Órgãos Vitais (脏 – Zàng) e cumpre justamente esse papel de ligação entre a nossa principal fonte geradora de nutrição física e energética diária, que é gerada pelo Estômago (胃 – Wèi) e pelo Baço (脾 – Pí), com o sistema físico-energético do Coração (心 – Xīn), onde ocorre o grande objetivo da nossa fisiologia básica, que é a formação do Sangue (血 – Xuè). Um Sangue rico, fluido e com facilidade de circulação é o gol pro nosso time da saúde.
Mas antes de pensar em deixar o Coração na cara do gol, o Pulmão tem de fazer uma verdadeira alquimia. O primeiro toque na bola se dá com a sua função mais direta, que é a troca gasosa. Mas além de captar oxigênio e eliminar gás carbônico, função essa totalmente atrelada à sua estrutura física, o Pulmão realiza uma outra captação do ambiente, que é a do Qi do Ar (空 氣 – Kōng Qì). Essa fonte de Energia é a segunda mais importante no nosso dia a dia, após a alimentação.
Captado o Qi do Ar, o Pulmão passa a depender da bola que vem da zaga, ou seja, da Energia que vem do Baço (脾 – Pí), chamada Energia dos Cereais (谷氣 – Gǔ Qì), como vimos no artigo sobre os zagueiros. Quando essa bola vem redondinha e caprichada, o Pulmão faz uma verdadeira mágica, como os grandes gênios do meio campo (Pelé, Zico, Sócrates, Maradona), sintetizando a Energia Torácica (宗 氣 – Zōng Qì), que é a união da Energia do Ar com a Energia dos Alimentos. Será essa Energia que chegará ao Coração, fazendo com que ele seja capaz de marcar o tão esperado gol.
Mas não é só de marcar gols que vive um time. É necessário também que não leve muitos. E onde começa uma boa marcação do time adversário? Também no meio campo, com os volantes. Nosso Pulmão também cumpre um papel fundamental na defesa do nosso organismo, pois uma parcela da Energia Torácica é transformada em Energia de Defesa (卫 氣 – Wèi Qì) e é dispersada para a superfície do corpo, sendo a principal responsável pela defesa do nosso organismo contra os chamados fatores patogênicos externos. Estes são os fatores climáticos que, quando são fortes, abruptos e/ou perduram em excesso, geram disfunções no nosso organismo. Eles são o Vento (风 – Fēng), o Frio (寒 – Hán), a Umidade (湿 – Shī), a Secura (燥 – Zào) e o Calor de Verão, ou também chamado de Canícula (暑 – Shǔ). Estes fatores em si podem gerar inúmeras alterações fisiológicas, mas a mais comum destas é a queda da nossa imunidade, fazendo com que bactérias, vírus e outros agentes dessa natureza possam se sobrepor à nossa resistência, gerando patologias.
Podemos começar a entender, portanto, que podemos contribuir muito com o nosso meio campo com algumas medidas simples, mas que fazem com que ele não precise ficar correndo atrás do outro time. Evitar a exposição excessiva a ambientes frios é um bom exemplo, já que a fisiologia de nós, brasileiros, em geral, é bem adaptada ao calor e somos mais vulneráveis à ação do Frio. Colocar um umidificador em casa quando passamos por muitos dias com baixa umidade do ar, nos protege da Secura. Evitar ficar com roupas úmidas em contato com o corpo nos protege da Umidade. Evitar correntes de Vento por períodos prolongados, especialmente quando dormimos. As mudanças de temperatura abruptas também são consideradas tipos de Vento (风 – Fēng) na medicina chinesa. Ficar entrando e saindo de ambientes com ar condicionado, por exemplo, prejudica muitos as funções e também a estrutura do Pulmão.
Quando um gramado está ruim, todo esburacado, e a bola fica se desviando pelo caminho, o time todo é prejudicado. Mas certamente o meio campo, que precisa tocar a bola com eficácia é muito mais. Dos nossos órgãos, o Pulmão também é o mais dependente do meio em que vivemos. Não só pela ação dos Fatores Patogênicos Externos, mas especialmente pela qualidade do ar. Numa cidade como São Paulo, onde o nível de poluição é altíssimo, não há Messi ou Ganso em campo que consiga tocar a bola corretamente, ou seja, teremos a formação da nossa Energia Torácica comprometida. É impressionante notar como muitas pessoas melhoram suas questões respiratórias simplesmente saindo de zonas poluídas.
Para que nosso time seja campeão, teremos de jogar num bom gramado. Para que sejamos verdadeiramente saudáveis, teremos de cuidar do nosso planeta, tanto para respirar um ar de qualidade, como para poder beber e comer alimentos de qualidade.
Leia os outros artigos da série:
Edgar Cantelli Gaspar – edgar@terapiaschinesas.com.br – Twitter: @edgarcantelli
-
A Interdependência dos Órgãos e Vísceras (Zang Fu)
Desde os primórdios do desenvolvimento das teorias e práticas da Medicina Tradicional Chinesa, especialmente compilados no Huang Di Nei Jing (黃帝内經), temos o entendimento que nossa fisiologia é especialmente comandada pelos Órgãos (Zang) e pelas Vísceras (Fu). Cada um destes possui um aspecto Yin, relacionado à sua forma, sua estrutura, sua base material e também um aspecto Yang, relacionado às suas funções, tanto físicas, conhecidas também pela medicina alopática, quanto energéticas, consideradas exclusivamente pela Medicina Chinesa.
Esse conjunto de funções e estruturas é visto tanto isoladamente como também interdependente entre si, ou seja, uma disfunção da nossa saúde pode ser decorrente do mal funcionamento funcional ou estrutural de um Órgão (Zang) ou Víscera (Fu), como também devido à influência de um deles no funcionamento do outro. O mais interessante é que todos relacionam-se mutuamente e portanto as Síndromes que envolvem mais de um Órgão (Zang) ou Víscera (Fu), na prática, são muito mais comuns do que as de um só.
Podemos pegar o exemplo da fisiologia do Pulmão, como entendida pela Medicina Chinesa: sua principal função é realizar a respiração, fazendo de forma eficaz tanto a troca gasosa, como a captação do Qi (Energia) do ar. Mas para realizar a inspiração, ponto mais crítico da respiração, ele depende do Qi (Energia) do Rim. Realizada a captação do Qi (Energia) do ar, o Pulmão forma o Qi (Energia) torácica, que irá para o Coração, onde acontecerá a união desta energia com o fluído do Sangue (Xue). Mas para formar um bom Qi torácico, o Pulmão depende do envio do Qi (Energia) Nutritivo feito pelo Baço, que é a energia extraída da alimentação, que por sua vez foi preparada pelo Estômago. Mas para que todas essas trocas energéticas aconteçam sem impedimento o Pulmão depende da manutenção do fluxo de todo o Qi (Energia) do corpo feita pelo Fígado sem impedimentos.
Esse é um recorte mínimo da nossa complexa fisiologia, como entendida pela Medicina Chinesa. É através dessa forma de compreender a saúde e a doença que conseguimos identificar uma origem comum a sintomas considerados muitas vezes desconexos pela medicina alopática.
Mas cada vez mais percebemos alguns sinais de que mesmo a medicina ocidental está retomando a visão de que nosso corpo é todo interdependente, como podemos ver nessa reportagem sobre o artigo científico publicado no Journal of the American Society of Nephrology, relatando uma pesquisa que mostra que pessoas com elevada taxa de descanso do batimento cardíaco são mais propensas a doenças renais.